Nos último anos, empresas de consultoria em TI e em gestão empresarial, assim como grandes organizações, começaram a levar o design centrado no ser humano para dentro de seus negócios. Este processo tem sido feito tanto por meio da aquisição de estúdios de design quanto pela contratação de designers para integrar suas equipes.
Da mesma forma, estúdios de Design de Serviço estão usando o Design de Negócio para aumentar a relevância estratégica de seus projetos para seus clientes.
Este movimento está acontecendo em resposta ao crescente número de organizações que estão em busca de soluções que alcancem o seu potencial digital, que atendam às expectativas dos clientes e entreguem um serviço de qualidade e consistente através de diferentes canais.
Este artigo compartilha uma série de observações sobre como temos, na Livework, acompanhado a mudança do mercado em direção ao Design de Negócio. Ele também descreve as consequências desta transição em relação aos processos das organizações e aos resultados para os clientes.
Empresas de consultoria estratégica estão, de forma crescente, adquirindo estúdios de design. Uma vez que o design é uma tendência nos negócios, empresas de gestão e TI iniciaram uma corrida para adquirir empresas de design estratégico, levando uma abordagem centrada nas pessoas e profissionais talentosos para dentro de sua operação com objetivo de melhorar sua oferta digital.
Em Julho de 2015 a renomada consultoria de TI Wipro adquiriu a empresa de design estratégico Designit, em Maio do mesmo ano a consultoria McKinsey & Company adquiriu a Lunar e em 2013 a Accenture adquiriu a agência de design Fjord, para citar apenas alguns casos.
Enquanto especialistas em negócios adquirem conhecimento em design, empresas de design estão ampliando o que fazem, a fim de se manterem competitivas e relevantes para os seus clientes corporativos.
Transformação digital
Organizações fundadas nos últimos vinte anos foram criadas para e dentro do contexto da era digital. Para as empresas que surgiram há mais tempo, desenvolver vantagem digital é uma tarefa desafiadora e urgente. Criar vantagem digital não é tão fácil como pode parecer, uma vez que exige mais do que a digitalização de um serviço ou a construção de um novo aplicativo.
Mais do que isso, uma boa estratégia digital envolve tanto uma profunda compreensão das atividades que os clientes enfrentam, como também uma forte integração de funções internas que inclui TI, operações, cadeia de suprimento, suporte ao cliente, vendas, RH e finanças.
É comum encontrar atividades digitais fragmentadas dentro da organização, com a alta administração insegura sobre quem deve ser a liderança que coordenará a transformação digital – é o CTO, CIO, ou CMO? A capacitação digital traz consigo a necessidade de uma nova cultura, envolvendo novas habilidades e novas funções dentro da organização.
Infelizmente, a pressão para atingir metas de receita a curto prazo impede que as empresas realizem um investimento de longo prazo em sua transformação digital. Ao mesmo tempo, muitas organizações não têm uma compreensão clara do retorno sobre o investimento (ROI) de seus projetos digitais.
Finalmente, os programas digitais geralmente acabam impactando sistemas de TI existentes, os quais as organizações não estão preparadas para mudar, seja por razões políticas ou estruturais.
“Blá blá blá” do Cliente
O “blá blá blá” do cliente abrange todos os “mantras” gerenciais relacionados aos clientes. Por exemplo, “se aproximar do cliente”, “ouvir a voz do cliente”, “tornar-se mais centrado no cliente“. Resolver este desafio pode ser uma tarefa mais difícil do que a anterior, pois implica em realmente ouvir, entender e abraçar as expectativas dos clientes.
Praticamente todas as organizações no planeta recolhem feedbacks de seus clientes por meio de pesquisas e grupos focais. Contudo, estes métodos têm a limitação de ser sistemas fechados que forçam as pessoas a responder a questões específicas. Os resultados raramente geram novas informações – de forma geral o feedback valida principalmente o que a organização já sabe.
Experiência Cross-Channel
Apenas os clientes têm o prazer de experimentar as organizações como um todo. Ao interagir com a organização, seja visitando uma loja ou escritório, telefonando para a central de atendimento ou tentando fazer compras online, os clientes começam a experimentar toda a organização e seus silos.
Cada departamento trabalha para atender os clientes, mas nenhum deles realmente os conhece. Proporcionar uma experiência suave e holística através de todos os diferentes canais, assegurando, ao mesmo tempo, qualidade consistente, requer uma mudança fundamental do pensamento: saindo do foco nos processos internos e indo em direção ao foco na experiência do cliente – de “de dentro para fora” para “de fora para dentro”.
Consultoria de Design de Serviço vs empresas de Consultoria em Gestão
Estes não são novos desafios. Muitas organizações têm se esforçado por anos para encontrar soluções para eles. A maioria delas opta por procurar a ajuda em empresas tradicionais de consultoria em gestão empresarial, as quais muitas vezes conduzem o processo por meio de uma abordagem quantitativa e com “soluções de prateleira”.
Como consequência, é comum as consultorias entregarem soluções que são difíceis de implementar, pois não são adaptadas para a organização, ou mesmo soluções que simplesmente não atendem às expectativas dos clientes.
Por outro lado, algumas organizações optam por procurar a ajuda de consultorias de design de serviço. Nestes casos, as empresas muitas vezes são deixadas com um grande conceito de serviço focado nos clientes, mas não leva em consideração as capacidades organizacionais atuais para prestação dos serviços desenhados.
Abraçando o Design de Negócio
Consultorias de design de serviço começaram a transição no sentido de utilizar linguagem e oferta comercial mais relevantes. Hoje, quase metade das consultorias de design de serviço ao redor do mundo oferecem design de negócio como parte de sua oferta (Sangiorgi, et al., 2015). A Livework é uma delas.
Design de negócio é agora um recurso complementar adicionado a qualquer projeto de Design de Serviço, ao ponto que, a cada equipe de projeto seja envolvido um designer de serviço e um designer de negócio. Isso é feito para garantir que cada projeto atenda às expectativas dos clientes, utilize drivers e métricas de negócios e leve em consideração políticas, práticas, processos, pessoas e sistemas da organização. A Livework está mergulhada nessa jornada.
Como parte da equipe que está liderando essa transição, estou pesquisando sobre o valor acrescentado à organização por meio do Design de Serviço – o que é e como medi-lo. Nesta fase do texto, vou compartilhar observações sobre o que significa executar um projeto de design de negócio + design de serviço na prática, quais são as consequências para a consultoria que a entrega, bem como os ganhos do ponto de vista da organização.
Por dentro de um projeto de Design de Serviço
Um projeto de design de serviço coloca o cliente no centro de qualquer intervenção. Entender o cliente e projetar uma melhor experiência a ele são aspectos centrais de qualquer projeto de Design de Serviço.
Um leitor ávido de textos sobre design thinking ou design de serviço espera que o processo de um projeto alterne entre as etapas de divergência e convergência. E isso é exatamente o que parece para um observador externo ao analisar o processo. Na realidade, no entanto, o que muitas vezes acontece é uma exploração contínua, sem um verdadeiro momento de convergência da informação.
Dentro de um projeto de Design de Serviço + Design de Negócio
A Figura 2 mostra um processo simplificado por trás de um projeto que combina tanto conhecimento de design de serviço como de design de negócio. Neste caso o cliente continua sendo central e torna-se a lente através da qual a equipe olha para o negócio e para a organização. O processo explora três ângulos, focando em:
- Entender o cliente;
- Entender drivers e métricas de negócio;
- Entender políticas, práticas, processos, procedimentos, pessoas e sistemas.
A compreensão do negócio e da organização como um todo fornece os limites naturais para o projeto de design de serviço. As entregas são três atividades importantes (ao lado direito do gráfico):
- Justificar escolhas através da construção de um modelo de ‘business case’. Isto dá suporte ao patrocinador de dentro da organização para a venda do conceito internamente e, ao mesmo tempo, garante a sua implementação.
- Visualizar a experiência desejada do cliente. Isto é particularmente importante, a fim de criar uma visão partilhada do serviço dentro organização.
- Construir um plano para a execução e implementação baseado em capacidades atuais disponíveis. Isto irá produzir resultados rápidos.
Vodafone: Uma abordagem de Design de Negócio + Design de Serviço
Vamos dar uma olhada sobre o que isso significa na realidade. Vodafone, uma das maiores empresas de telecomunicações, aproximou-se da Livework com um desafio cross-channel. Como discutido anteriormente, a experiência cross-channel é uma das três áreas onde as organizações procuram acertar. A Livework sugeriu que a organização enfrentasse o desafio usando uma abordagem de design de negócio + design de serviço.
A equipe, composta por designers de serviço e de negócio, realizou uma Entrevista em Profundidade com clientes, enquanto ao mesmo tempo procurava compreender claramente, e ainda numa fase muito precoce, os drivers do negócio e as práticas, processos, políticas, pessoas e sistemas da Vodafone.
Um dos muitos insights que surgiu na fase de entendimento do cliente foi que quando as pessoas compram um novo telefone on-line preferem pegá-lo na loja em vez de recebê-lo em casa. Foi identificando que os clientes querem ajuda dos atendentes da empresa para transferir dados de seu telefone antigo e obter orientações sobre como usar o seu novo dispositivo. Percebeu-se, então, que o recibo, o set-up e os primeiros estágios de uso de uma nova assinatura de telefone são os principais pontos de dor para os clientes no setor de telecomunicações.
Um projeto comum de Design de Serviço, que aparentemente aborda apenas a experiência do cliente, teria projetado uma solução que inclui a opção do cliente retirar o telefone comprado on-line na filial mais próxima. Contudo, a Vodafone simplesmente não estava preparada para isso. Ou seja, com o sistema que a empresa tinha disponível não havia nenhuma maneira de saber qual telefone estava em qual loja, pois o seu sistema foi criado para realizar entrega em domicílio. Portanto, a empresa não estava equipada para informar os clientes sobre onde ir para recolher o seu novo telefone.
Assim, sugerir adicionar a opção de pegar o telefone na filial mais próxima teria significado um trabalho caro e demorado para o sistema de TI da Vodafone. Além disso, atendentes da agência estavam preparados e disponíveis para vender, e não para servir aos clientes. Seus KPI’s estavam direcionados para números de contratos fechados e upsells (vendas adicionais) e, por isso, não tinham interesse em perder seu tempo precioso para ajudar os clientes a configurar seus telefones.
Em outras palavras, propor a possibilidade de os clientes pegarem seu novo telefone na loja mais próxima impactaria sistemas, políticas e pessoas da empresa (Figura 3). Como resultado, o projeto nunca teria sido implementado. Por meio do entendimento de como a empresa está configurada e de como os funcionários são recompensados, o cenário de serviço recomendado pela equipe de projeto foi a possibilidade de os clientes fazerem o pedido do seu telefone on-line e escolher uma das filiais da Vodafone como o endereço de entrega.
Além disso, uma nova métrica foi adicionada ao KPIs da equipe da linha de frente: que fosse recompensada por suporte pós-venda, mesmo que a venda tenha acontecido em um canal diferente da loja física onde estavam alocados. A solução encontrada tinha zero impacto sobre os sistemas e, ao mesmo tempo, muito pouco impacto sobre as políticas e as pessoas, permitindo à Vodafone pilotar imediatamente o novo cenário de serviço com 10.000 clientes.
O futuro parece brilhante
Organizações em todo o mundo estão enfrentando profundos desafios relacionados à transformação digital e ao entendimento do cliente. Estes desafios estão, de forma crescente, minando sua capacidade para se manterem competitivas em seu mercado – e descobrir a tensão que há entre o que os clientes esperam e o que as organizações realmente entregam a eles.
A solução para estes desafios não reside apenas na criação de melhores serviços para os clientes, mas também na compreensão de como transformar a organização para entregar estes serviços. O processo de enfrentar esses desafios requer uma combinação de capacidades que alavanquem tanto o design de serviço como a transformação por trás dos serviços em si.
Muitos estúdios de design de serviço em todo o mundo estão investindo na construção de uma combinação de capacidades. De forma geral, estes estúdios são pequenos – metade deles empregam menos de dez pessoas (Sangiorgi, 2015), e é plausível pensar que esta transição vai acontecer de forma rápida e em breve se tornará visível nas taxas de implementação dos projetos, bem como na forma como eles são medidos levando em consideração o impacto que produzem na organização.
Então o que acontecerá com grandes organizações como Accenture ou Wipro através das aquisições que fizeram? Será que os recursos de design adquiridos serão transformados em algo tangível para os seus clientes? Ou se perderão na grande máquina que representam, se tornando rapidamente “business as usual”?
Acredito que teremos esta resposta mais cedo do que mais tarde. De qualquer maneira esta transição representa uma oportunidade importante para o crescimento da prática do design de serviço e uma oportunidade de aprendizado para aqueles que acreditam no potencial do design de serviço para os negócios.
Este artigo é uma tradução livre de um artigo de autoria de Marzia Arico que foi publicado originalmente no livro DESMA Avenues, 2015.